A baiana Samille Ornellas, de 31 anos, voltou a sorrir após um período de dor e incertezas. Em agosto deste ano, ela havia perdido a vaga no curso de Medicina da Universidade Federal Fluminense (UFF), onde estudava como aluna cotista, por não ser considerada parda pela banca de heteroidentificação da instituição. Três meses depois, ela foi aprovada novamente em Medicina, desta vez, na Universidade Federal do Oeste da Bahia (UFOB).
“A universidade não teve nenhuma abertura para o diálogo, e o processo segue aguardando julgamento na Justiça. Mas Deus fez tudo certinho: fui aprovada em medicina na Universidade Federal do Oeste da Bahia. Eu nem lembrava mais que tinha me inscrito lá no começo do ano, mas passei agora, na 9ª lista de aprovados”, contou Samille ao g1.
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A nova conquista veio depois de uma fase difícil. Desde o desligamento da UFF, Samille enfrentou depressão profunda, crises de ansiedade e queda de cabelo, além de ter sido vítima de um golpe aplicado por falsos advogados que se apresentaram para ajudá-la no processo, um prejuízo de R$ 5,5 mil. “Toda aquela história me fez acumular traumas”, relatou.
A estudante diz que só conseguiu retomar as forças graças à fé e ao apoio que recebeu. “Ao mesmo tempo, eu tive ajuda de tanta gente, recebi tantas mensagens de apoio… Tem pessoas boas no mundo ainda. Mas eu que estava sem forças. Só pedia a Deus: me tire do lugar onde eu estou. Faça algo extraordinário na minha vida”, afirmou.
Em setembro, Samille se matriculou na UFOB, em Barreiras (BA), também pelo sistema de cotas. Passou por nova avaliação de renda e por banca de heteroidentificação, desta vez, sem nenhum problema. “Quando alguém fala a palavra ‘identificação’ ou entra em assunto de banca, eu imediatamente tenho crise de ansiedade, mesmo agora. Minhas mãos suam muito”, contou.
Ela diz que ainda sente medo ao abrir qualquer e-mail da universidade. “Pode até ser o cardápio da semana, já fico nervosa, com medo que algo dê errado. Ainda preciso superar esse trauma, mas é questão de tempo, se Deus quiser”, disse.
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O recomeço de Samille também carrega um significado emocional. Nos últimos meses, ela perdeu o pai e a avó e lamenta que nenhum dos dois tenha conseguido vê-la de jaleco. Agora, quer dedicar seus estudos à memória do avô, que morreu por falta de diagnóstico médico. “Um dos meus propósitos dentro da medicina é não deixar morrer quem teve acesso limitado a serviços de saúde”, declarou.
A UFF, por sua vez, reafirmou em nota que Samille foi considerada inapta por duas comissões independentes, compostas por membros capacitados em letramento racial. Segundo a universidade, o caso segue sob análise judicial e a instituição cumpre integralmente as decisões do Poder Judiciário.
Hoje, Samille tenta reconstruir sua trajetória, entre aulas, novas amizades e planos. “Aqui na UFOB, eu vou lidar com quem também mora longe de centros urbanos. Nesta semana, vamos visitar um posto de saúde rural e uma aldeia indígena. Estou muito animada”, disse.
E completou, emocionada: “Já estava sem forças. Mas Deus fez tudo certinho”.
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